Por que fatos não mudam opiniões?
Novo episódio de Persuasão, a coluna de estudos e artigos do Projeto Brief, mostra os mecanismos o que faz o cérebro rejeitar fatos e estatísticas - e como driblar esses mecanismos
Olá, assinante!
Imagine que você precise explicar (sem pesquisar, claro!) como funciona um vaso sanitário… Simples, não é? Uma caixa de porcelana, coberta de água, com um botão que esvazia e renova esse reservatório. Mas como isso acontece, na prática? Rapidamente a gente vai perceber que não é só porque todo mundo sabe o que é, que todo mundo sabe como funciona.
“Mas o que isso tem a ver com os principais fatos da semana - principalmente a denúncia de Bolsonaro pela Procuradoria-Geral da República?” Calma, que a gente já chega lá.
O exemplo anterior, apesar de inesperado, foi tirado de um estudo real conduzido em Yale para compreender nosso sistema de crenças, nossas certezas e nossa compreensão do mundo. Principalmente, nos ajuda a entender um pouco melhor sobre por que fatos, muitas vezes, não conseguem mudar opiniões. E este, que é um dos maiores desafios para quem tenta fazer diálogo e convencimento político, é o tema do episódio dessa semana de Persuasão - a série de estudos e artigos que o Projeto Brief traz para nos ajudar a transformar a disputa política em resultados palpáveis no fortalecimento da democracia e dos direitos humanos.
Neste episódio, exploramos - e traduzimos - o artigo “Por que argumentar com fatos não muda opiniões - e o que fazer ao invés disso”, publicado (em inglês) por Devon Bowker (um ativista pela natureza e professor de biologia que compartilha seus pensamentos e ideias no perfil "Devonthenatureguy"). Em uma linguagem facilitada e prática, Devon explica como nosso cérebro encontra mecanismos para nos proteger não só de mudar de opinião, diante dos fatos, mas também de reforçar nossas certezas diante do contraditório. Parece um pouco com aquele grupo que nega cada vez mais a realidade, a ciência, as vacinas e os resultados das eleições, não importa o quanto se mostre evidências de que essas visões são erradas e perigosas, né?
Esse é um estudo sobre aquilo que conhecemos como “viés de confirmação” - mas também sobre estratégias efetivas para burlar, ou pelo menos diminuir, os efeitos desse fenômeno e, quem sabe, fazer com que fatos tenham alguma chance contra opiniões arraigadas.
A chave está em diálogos verdadeiros, conexões reais e trocas mais profundas. Os dados permanecem no discurso. Mas ganham mais força quando caminham juntos de histórias interessantes, ganchos emocionais, a certeza da boa intenção e de um enunciador com quem compartilhamos aspirações em comum.
Você já pode ler o artigo completo gratuitamente no site do Projeto Brief, e entender toda a lógica por trás desse mecanismo. E a partir dali, aplicar as principais dicas práticas para conversar com as pessoas sobre verdades que elas não acreditam:
Os 3 passos para desviar do viés de confirmação
A estratégia que Devon criou para ultrapassar as defesas do cérebro, é o que ele chama de “Deep Canvassing" [que nós traduzimos, por aqui, como "troca aprofundada"]. Um caminho para construir conexão e curiosidade. E pode ser resumido em 3 passos fundamentais:
Comece ouvindo, fazendo perguntas que te permitam saber mais sobre a pessoa com quem você vai conversar.
Antes de falar sobre política, por exemplo, experimente perguntas que revelem a visão de mundo e as experiências pessoais das pessoas: perguntar opiniões sobre eventos comuns, como mundo das celebridades ou programas de TV, sempre traz informações valiosas. Já reparou que, ultimamente, até em uma conversa sobre o clima, a gente conhece a visão política dos outros?Antes de trazer dados, use situações reais ou hipotéticas, de impacto. Principalmente experiências pessoais!
Durante a pandemia, ficou muito claro que falar do sofrimento e das histórias de vida atravessadas e até interrompidas pelo Covid-19 era mais efetivo para convencer as pessoas a seguirem as normas de segurança do que apenas dizer, com estatísticas, que máscaras e isolamento social salvavam vidas. Mas nem só histórias tristes e dramas pessoais funcionam. Quantas histórias engraçadas na sua vida não te ajudaram a mudar sua visão de mundo?Desafie as suposições das pessoas com informações novas, sem criar confrontos.
Você não vai convencer um apoiador de Bolsonaro de seu envolvimento nos planos golpistas de 2023 apenas chamando-o de "criminoso", "golpista" ou "corrupto". É mais eficiente perguntar: "você viu as mensagens que a polícia encontrou no WhatsApp dele, que o informam do andamento dos planos golpistas?” Assim, você demonstra que há evidências.
#RadarBrief | O que aprendemos sobre viés de confirmação
Já avisamos: se você quer saber mais sobre deep canvasing, viés de confirmação ou “black effect” (lê o artigo pra descobrir o que é!), prepare-se para mergulhar de cabeça! O assunto é fascinante, com infinitos desdobramentos, e tem tirado o sono dos pesquisadores em todo mundo. Esta semana, separamos 3 dicas que vão te ajudar a expandir rapidamente sua compreensão sobre esse universo - e sobre nós mesmos.
Why Facts Don’t Change Our Minds [Por que fatos não mudam nossas mentes] - The New Yorker | Neste artigo (em inglês), Elizabeth Kolbert explora alguns dos principais estudos sobre viés de confirmação para mostrar como ele se forma na mente e por que confrontar opiniões com fatos só contribui para reforçar a crença original.
Como falar com um negacionista da ciência - Lee McIntyre | Livro fundamental para quem quer entender - e combater - o negacionismo. Também usando casos reais (como a visita a uma convenção sobre a Terra Plana), este livro é um guia inicial para nos re-ensinar a fazer aquilo que nos constitui enquanto sociedade: a capacidade de dialogar, ouvir e aprender.
Comunicação como estratégia para forjar novos imaginários - TedX Blumenau | Colocando as “mãos na massa”, a diretora em Pesquisa de Marketing, diretora da Quid e membro do Projeto Brief, Maíra Berutti, parte de casos e exemplos reais da disputa pela democracia, principalmente na internet, para mostrar caminhos de troca de uma comunicação taxativa e negativa, que promove afastamento, por uma comunicação propositiva e atraente, que ajude a aglutinar os diferentes em objetivos comuns.
E quanto a você? Quais são suas estratégias para conversar sobre política, sociedade ou democracia com quem não é tão próximo ou até mesmo discorda de você?
Conta pra gente, em resposta a esse e-mail, e vamos juntos fortalecer essa construção comum.
Um abraço,
Equipe do Projeto Brief.